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GORUTUBANOS

 A cidade de Janaúba, situada no Norte de Minas Gerais, possui em seu histórico uma característica interessante: Quem nasce lá é Janaubense, mas também é Gorutubano. Gorutubano é a denominação de quem nasceu no Vale do Rio Gorutuba. Será? Sim e não. O termo Gorutubano que denomina os moradores daquela região é, de fato, relativo a quem nasceu às margens do Rio Gorutuba, mas, historicamente, remonta aos primeiros moradores da cidade, um povo negro, que veio fugido do sul da Bahia e, bem ali, no Vale do Gorutuba, construiu suas “taperas” e suas famílias, muitas dessas, surgidas do casamento com índios Tapuias.


 

 Ser chamado de Gorutubano até algum tempo atrás era considerado quase pejorativo por aqueles que ali nasceram. Sobretudo, se chamados de “Gorutubanos do pé rachado”. Essa expressão conferia a quem fosse chamado assim a característica dos negros moradores da cidade, pessoas que não possuíam sapatos e por isso andavam descalças em qualquer circunstância. Com o passar do tempo, seus pés se tornaram fortes, cascudos e com rachaduras, daí a referência “pé rachado”.

 

 Nas escolas de Janaúba, nunca se informou muito aos alunos sobre esses primeiros desbravadores da cidade. O povo Gorutubano sempre foi mencionado como um povo exótico, que fazia blusas bordadas à mão, tinha o pé rachado e trocava as palavras que tinham som de AN por ON. No entanto, há mais ou menos 5 anos, diante de uma pesquisa aprofundada desenvolvida por pesquisadores de uma ONG e pela FUNDAÇÃO PALMARES, o que era latente tornou-se oficial. O povo Gorutubano era realmente descendente de quilombos baianos, e, portanto, suas comunidades no entorno da cidade, eram comunidades quilombolas.

 

Há, hoje em dia, mais de 15 (quinze) * comunidades Gorutubanas situadas em torno de Janaúba, a maioria delas é composta por pessoas que trabalham no plantio de banana, uma das principais fontes de renda da região. São, em sua maioria absoluta, pessoas muito simples, com pouco conhecimento intelectual, mas, com uma riqueza oral e de memória impressionantes.

 

 Em suas comunidades já se percebe as influências da mídia, sobretudo, nos valores dos moradores mais jovens que acompanham atentamente pelo rádio todos os “hits” musicais do momento, gostam de Britney Spears e Beyoncé, assistem á novelas e opinam sobre a vida dos artistas, alguns usam tatuagens e piercings. Essa seria a configuração de uma comunidade comum, surgida na periferia de uma cidade que se caracteriza, como diversas cidades brasileiras, como um lugar desigual e inóspito para quem está a margem. Todavia, o povo Gorutubano possui características que desconfigura esse padrão, pois possuem em sua história elementos notáveis passíveis de se tornarem patrimoniados como bem oral e histórico da cidade. Um desses elementos é o Batuque, uma dança regional que lembra muito os terreiros de candomblé e umbanda, sobretudo no que diz respeito à vestimenta utilizada. O Batuque geralmente acontece depois das rezas ou em festas das comunidades, é tocado por homens e dançado pelas mulheres, nunca o contrário. Os instrumentos utilizados são feitos de madeira e couro curtido de boi. As músicas cantadas saem em forma de rimas e versos, e, por muitas vezes, são criadas na hora. As mulheres geralmente dançam o Batuque aos pares, com outras mulheres, numa roda formada só por elas.

 

 Outro elemento bastante instigante e que caracteriza bastante as comunidades Gorutubanas diz respeito à linguagem. Ainda que tenha se passado muito tempo desde a chegada dos primeiros Gorutubanos nessa região (A história menciona o ano de 1895) seus descendentes ainda se comunicam com um sotaque que é considerado “original” por povos dessas descendências. Palavras que tem som de AN são ditas de forma corriqueira com o som de ON. Um exemplo é a palavra Plantar que é pronunciada por alguns Gorutubanos como “Plontar”.

 

 Uma das comunidades Gorutubanas mais características (nos aspectos mencionados) é a Vila Nova dos Poções. Localizada a 9 km da cidade de Janaúba, a Vila é uma comunidade que “se descobriu” quilombola e hoje seu povo vivencia seu autoconhecimento e sua autoestima como jamais experimentaram antes. Qualquer visitante que chegue à Vila é convidado, ainda que de forma indireta e por vezes quase induzido, a comentar sobre a “nova” característica da comunidade. Percebe-se com clareza a influência de medidas governamentais e a atuação não-governamental no sentido de preservação da memória e da identidade étnicas nessa comunidade. Seus moradores discorrem a todo o momento sobre o que é ser quilombola. Fazem alusão a tradições e costumes que os encaixam nesse perfil.

 

 A Vila Nova dos Poções é uma das comunidades quilombolas Gorutubanas a ser decifrada por este projeto, ora intitulado “Gorutubanos”.

 

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